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segunda-feira, 4 de junho de 2012

Sobre os conselhos, comentários e julgamentos no pós-parto

6o texto no Portal Uma Mãe das Arábias


Sobre os conselhos, comentários e julgamentos no pós-parto
Acho que uma das coisas que ouço os pais mais reclamarem nos grupos de pós-parto é sobre as falas dos outros a respeito de suas escolhas e modos de agir com seus filhos e filhas. Queria fazer um recorte sobre este tema – que é super amplo, e que dá muito pano pra manga – e aprofundar em um aspecto que acho importante.
O casal, ou a mãe, muito provavelmente estão vivendo a chegada de um(a) filh@ pela primeira vez e, se não, ainda assim, cada filho é um filho, e somos sempre diferentes a cada nova experiência.  Usei a palavra experiência não à toa. A experiência, o experimentar, acaba, muitas vezes, sendo obscurecido debaixo da enxurrada de conselhos, comentários e julgamentos que caem sobre vossas cabeças... e quando eles vêm, fecha o tempo.  Acaba a brincadeira e pode vir a raiva, o medo, a insegurança.
Qualquer semelhança com o universo infantil não é mera coincidência... a gente pode, pela culpa e pela raiva, perder de vista o que exatamente está se dando e que, aliás, é o essencial: que nós possamos experimentar modos de ser e chegar às nossas próprias descobertas. Os conselhos e comentários podem até nos servir de referência, porém, de nada servem se não pudermos senti-los adequados a nós, e isso só se dá por meio do nosso contato real com a experiência. Senão é mera reprodução.
Se tem uma coisa que a criança desperta e continuará despertando em seus pais é a novidade. Porque que então, os pais deveriam saber como ser? E uma vez sendo alguma coisa, dentre tantas possibilidades, ela também não pode ser uma via de conhecimento, válida e legítima? E qual o problema em rever tudo depois, reinventar, a partir de necessidades ou sentimentos reais? Não é assim que os cientistas e artistas – exploradores por excelência – são e agem?
Se pudermos cultivar o ser explorador em nós, também acolheremos essa possibilidade em nossos filhos, que desde cedo são exatamente assim: pequenos descobridores, que desbravam essa aventura que é a vida. E quantos tesouros eles desvendam... Certo e errado, bom e mal, ganham consistência assim. Não porque me disseram, mas porque descobri assim. Ampliam-se assim as possibilidades de estar na vida, e ganha-se algo precioso: a maturidade.

terça-feira, 29 de maio de 2012

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Ser mãe é um ato de generosidade e coragem


5o texto no Portal Uma Mãe das Arábias


Ser mãe é um ato de generosidade e coragem
Pra muitas, este domingo foi o primeiro dia das mães, já com seus bebês no colo. Para muitas outras, foi com o bebê na barriga. Mas antes da existência desses bebês, mesmo não sendo mães ainda, uma ideia de maternidade já desde sempre as acompanhou, seja biologicamente, por terem um corpo que as permite gerar, seja social ou culturalmente, nas brincadeiras de boneca de menina, na forma como a maternidade é propagada em nosso meio, na relação que estabeleceram com suas mães desde pequenas, ou com alguém que cumpriu este papel. Antes d@ filh@ de fato chegar, e termos de nos relacionar com eles concretamente, a maternidade é muito mais uma potencialidade, uma ideia.
Quando o bebê de fato chega, já não é mais com a ideia de filh@ que nos relacionamos, mas sim com alguém de carne e osso, um alguém que não se sabe alguém ainda, mas ainda assim, com comportamentos, necessidades e desejos. Da ideia à concretude da experiência de ser mãe, dá-se um grande passo: vou daquilo que já está dado biológica, social e culturalmente, para uma aceitação de uma tarefa que não terá fim; a tarefa de ser alguém para alguém.
Há um termo bastante usado na psicologia que busca nomear esse encontro entre mãe e bebê e a formação desta relação. Usa-se muito a palavra vínculo, que no seu sentido mais corriqueiro, quer dizer laço, ligação. Essa ligação, porém, não é simplesmente biológica.  Laço sanguíneo não decreta maternidade. Ela também não é social, ter um filho não certifica maternidade. Tampouco é simplesmente cultural, já que agir desta ou daquela maneira não representa ser mais ou menos mãe. Isto que digo pode parecer óbvio num primeiro momento, mas nossas dimensões sociais, culturais e biológicas podem acabar obscurecendo o que de fato é necessário que se dê para que haja uma relação verdadeira entre uma mãe e seu filho.
Gosto sempre de incluir uma palavrinha a mais quando me utilizo do termo vínculo para falar da relação entre mãe e bebê. Gosto de falar que é necessário que haja um vínculo com envolvimento. Por quê? Justamente porque esta ligação é antes uma construção, nem algo já dado, nem algo a ser conquistado como um fim.
Quando eu me envolvo com alguém, me aproximo dela, toco e me deixo ser tocada. Vou conhecendo ela, e ela a mim, por todos os lados. Envolver-se não é fácil, é topar descobrir e ser descoberto, mexer e ser mexido, é inevitavelmente transformar e ser transformado pela presença deste alguém. Neste sentido, envolver-se não é algo que se dá de imediato, assim que o bebê nasce puramente por instinto. A experiência de um papel social ou a participação em um modo de ser numa dada cultura também não garantem um envolvimento. O que promove o envolver-se é estar aberto para a transformação. É um ato de extrema generosidade e coragem.
Acho que a grande beleza da maternidade mora, não naquilo que a vida biológica, social ou cultural oferece, mas no desafio de fazer-se conhecer e abrir-se para conhecer um(a) filh@.
Um brinde a todas vocês no dia das mães pela generosidade e coragem!

quinta-feira, 10 de maio de 2012

Sobre mim

Sou psicóloga clínica formada pela PUC-SP em 2004. Sou uma entusiasta da abordagem fenomenológica existencial, e por meio dela que conduzi e ainda conduzo meu trabalho clínico.Trabalhei no consultório desde que me formei até viver um pequeno recesso em 2007, quando nasceu meu filho Francisco, na noite mais fria do ano, e de uma lua cheia de muitas surpresas... a chegada do Chico despertou em mim um interesse apaixonado pelo universo da maternidade, e, com ele pequenininho ainda, concluí uma especialização em psicologia no SEDES SAPIENTIAE em gravidêz, parto e puerpério, além de um curso de doula (acompanhamento físico e emocional no parto). Acompanhei muitos partos desde então, e, a convite de Ana Cristina Duarte, obstetriz e coordenadora do GAMA (Grupo de Apoio a Maternidade Ativa), passei a coordenar grupos de pós parto. No Gama eu fiquei até 2010, concluindo 2 anos de grupos por lá. Fui depois convidada pelo pediatra do meu filho, o Cacá, a continuar essa coordenação em seu espaço, que agora em 2012, se inaugurou como Espaço Nascente, cheio de atividades para mães e pais, e com um enfoque no cuidado depois que o bebê nasce...mas também depois que cresce, acompanhando seu desenvolvimento, e de seus pais também. Neste momento, me dedico a acompanhar gravidêzes, partos e pós partos, no consultório, em grupos e na casa das pessoas também. Escrevo refletindo sobre as dores e delícias dessa vida, como diria Caetano Velloso, e, costumo postar meus textos aqui no blog, pra quem se interessar.
No blog vocês vão encontrar muitos textos meus, infromação sobre meu trabalho e cursos que ministro, além do que acaba saindo na mídia. Seja muito bem vind@!
Um forte abraço,
Cris Toledano

O sintoma pelo olhar fenomenológico

Já a fenomenologia entende o sintoma como sendo um indício de uma condição de restrição das possibilidades de ser, bem como uma manifestação de sofrimento e dor. A medida desta restrição é dada pelo próprio paciente, uma vez que seu sentido se constrói não apenas a partir de uma análise dos sintomas em si, mas de uma compreensão da totalidade da sua existência. Pode-se dizer que a medida da restrição é de algum modo equivalente à medida do sofrimento.

Sobre a preparação para o pós parto

4o texto para o Portal Uma Mãe Das Arábias

Sobre a preparação para o pós-parto

É possível se preparar para o pós-parto?
Sim e não!
Deixa eu me explicar...
Independente de como escolhemos empreender uma preparação para a chegada do bebê, o que acaba operando dentro da gente, e o que faz com que sintamos mais segurança e conforto, é o fato de que algo, no caso o pós-parto, passa a fazer parte do nosso universo de preocupações, e, assim, podemos nos organizar para que tenhamos o máximo de recursos para agir diante do novo. 
Porém, quando estamos a nos preparar para algo, é quase inevitável sermos levados a considerar aquilo que sempre escapa à preparação, não é mesmo? Aquilo que imaginamos está sempre à mercê do que concretamente irá se dar, há sempre a possibilidade do imprevisto, da novidade...
A preparação portanto abarca tanto a nossa potência, quanto a nossa impotência. Levar ambos aspectos a sério é empreender uma verdadeira preparação. Por que digo isso?
Considerar que a preparação é um fim em si mesma é justamente não se preparar para o que de novo e surpreendente pode acontecer. Quando o imprevisto se der, ele pode acabar não sendo muito bem recebido. É capaz que vivamos tomados pela frustração ou ressentimento, pela paralisação ou pelo enrijecimento. O inverso também pode acontecer: se o pós-parto não puder fazer parte de nossas preocupações, quando ele chega, pode arrebatar, pois nos vemos sem os recursos para agir diante do novo. 
Preparação, portanto, é estar presente para receber. Mas, ao receber, saber também que necessariamente irei me transformar. Preparem-se para a chegada de seus filhos, mas não se esqueçam também que eles são... a novidade!

domingo, 29 de abril de 2012

Sobre o conflito de gerações no pós parto



Sobre o conflito de gerações no pós-parto
O ano é 2012, nasce Kai, um menino cujo nome quer dizer “mar” em havaiano. A mãe desse bebê trabalha, seu pai também, e ambos contribuem com a renda da casa. Eles não têm babá, e o pai é incentivado a participar do cuidado do filho, ele dá o banho no balde, troca a fralda de pano e usa sling para passear e pôr o bebê pra dormir. Todos dormem juntos na cama, e seguem a amamentação em livre demanda. O bebê, mesmo sendo menino, usa rosa, passa muito tempo só de fralda e se alimenta somente com o leite materno. Este bebê não usa chupeta e mamadeira, toma homeopatia e nasceu de parto natural domiciliar na banheira. Seus pais são vegetarianos, vão introduzir uma alimentação vegetariana no filho também, e ficarão até os 2 anos sem dar leite de vaca a ele. Açúcar também. Não pensam em vaciná-lo. No chá de bebê, ganharam somente fraldas de pano, e o pedido expresso a todos da família foi: nada de andador nem chiqueirinho, o bebê precisa se locomover livremente, sem ajuda.  Saem de casa com o bebê desde os primeiros dias de vida.
Esta é uma família de classe média em São Paulo que participou do meu grupo de pós-parto. Resolvi escrever sobre eles porque, mesmo circunscritos a uma classe social onde há uma gama infinita de representações de maternidade e paternidade distintas – que podem se assemelhar ou se distinguir radicalmente desta –, mesmo não representando a realidade das outras classes sociais, seguindo uma ideologia tida como “natureba” e que não configura a regra, já são uma expressão do que é possível ser vivido hoje em dia como escolha de maternidade e paternidade. Se, para muitos leitores, algumas escolhas podem parecer radicais, imaginem para os avós desse bebê...
Um dos temas mais discutidos no grupo é o choque de geração que os pais (ou melhor avós) do século passado vivem diante dessa nova leva de pais do século XXI. Em maior ou menor grau, esse choque é inevitável. Os tempos mudaram, os valores que inspiram e o contexto concreto da vida já não são mais os mesmos que aquele de 30 ou 40 anos atrás. Mas é aí que a porca torce o rabo... Emocionalmente todo mundo é mexido.
Os novos pais se sentem invadidos com as críticas dos avós e dos representantes desses modos mais consolidados do cuidar. Os avós, em contrapartida, podem se sentir excluídos desse cuidar, ou até ofendidos com essas novas propostas que podem ser um pouco ou muito diferentes do que praticaram. Já pensei bastante sobre o por que ambas as partes, os recém-pais e os recém-avós vivem tão fortemente esse conflito, às vezes de maneira bastante agressiva, e me parece que esse conflito de gerações fica intenso por tocar em questões íntimas importantes, para um e para o outro.
É muito comum que os recém-pais sintam necessidade de se diferenciarem do modo como seus pais cuidaram deles. Vejo isso como uma possível expressão de uma busca por AUTONOMIA que precisa ser vivida, para que esses recém-pais sintam que são os protagonistas dessa nova etapa da vida. Por toda a história da humanidade, essa dialética acontece: eu preciso me afastar, e até negar o que foi, para conhecer outras possibilidades. Isso pode até ser vivido de maneira tranquila por ambas as partes, mas é a condição para que sigamos com a evolução dessa mesma humanidade.
Agora, este movimento necessário – e até inevitável – acontece justamente pondo em questão um dos pontos mais sensíveis para os avós e as pessoas de um modo geral, que é a forma como se escolhe cuidar de – e portanto amar – seus filhos. É como se estivesse sendo dito que os pais de outrora fizeram mal, ou fizeram de menos, mesmo que isto não seja a intenção nem a realidade sentida pelos recém-pais. Isso pode gerar mágoas, ressentimentos e até raiva...
O que se coloca, portanto, é que ambas as partes vivem uma desestabilização: uns por ter de viver novos enfrentamentos na relação com os seus pais, outros por se verem confrontados e verem quebrar paradigmas que para eles eram tão certos, tão familiares, que lhes traz segurança. Estes últimos se veem muitas vezes sem poder usar de recursos “conhecidos” para cuidar desse bebê: “Como não vou dar chupeta, se era isso que acalmava você, meu filho?!”
A quebra de paradigmas abala o mundo todo, o velho e o novo. Esse abalo sísmico deixa a todos muito sensíveis, mas pode também criar condições para que essa relação entre as gerações possa acontecer em novas terras, novas bases.
Estou por aqui, as 3as feiras, quinzenalmente, e toda segunda feira, ao vivo no espaço nascente (http://espaco-nascente.blogspot.com.br/) coordenando o grupo de pós parto. Ficarei feliz de dialogar com vcs leitores, podem entrar em contato comigo com dúvidas ou sugestões de tema, por email ou por telefone: cristoledano@hotmail.com 11 9966-2314